"Testamento de Hipatia"

  •  Acerca de Livros e Leitores

    ©  Lúcia Costa Melo Simas .( 2011 )

 
 
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Era uma vez um Jardim onde ....

[ Parque em Brugges (pormenor).  Bélgica. 2007 ]

© Levi Malho - Imagem digital

         


                                                       

 

O friend unseen, unborn, unknown,

Read out my words at night, alone:

I was a poet, I was young.

Since I can never see your face,

And never shake you by the hand,

I send my soul through time and space

To greet you. You will understand.

 

James Elroy Flecker

 

    Uma biblioteca foi sempre um lugar de viagens. Dessas que surgem inesperadamente e nos levam para lugares de espantos, de perplexidades e interrogações. Viagens que nos fazem voltar mais contentes ou diferentes. Viagens que nos convidam a percorrer territórios sem fim e desconhecidos. Há mapas, plantas, cartas de marear mais ricas e misteriosas do que as terras descobertas. Sem linhas rectas, por entre atalhos, teias de rotas voam para toda a parte, para além daquelas que todo o conhecimento herdado nos pode oferecer.
    Fascínio de um livro que nos espera e a curiosidade espreita!
   O apelo à imaginação, à lógica, ao sonho multiplica as viagens. Há quem diga que os livros são escritos por quem tem imaginação e lidos por quem não a tem. Ler sem imaginar, é ser profundamente infeliz face à prodigalidade de qualquer escrita que abre sempre novos horizontes e mundos diferentes.
   Basta ver a sedução dos velhos livros da escola! Capas intrigantes e vagamente desbotadas. Meia dúzia de letras, três ou quatro palavras pintadas de infâncias e mil caminhos para nunca mais esquecer como se fossem a chave para a entrada na caverna bem maior do que a de Ali Babá. Repete-se agora com nostalgia.
   Olha-se para uma estante! Imediatamente, milhões de páginas esperam um convidado.
Antigamente, quando se entrava numa imponente e sombria biblioteca, havia a solenidade sagrada de um qualquer lugar similar a um venerável santuário, arcano, um templo de mistérios, quase como se algo numinoso houvesse ali oculto.
    Quem teve a sorte de conhecer uma soleníssima biblioteca de misteriosos veludos vermelhos e severos quadros, com paredes de ricas e douradas madeiras, desconfia haver por lá um proprietário perturbado na sua magnificência seráfica. Um certo pejo nos passos que se tornam tímidos e as vozes sedosas no ambiente que cala os mais teimosos.
    Para além da penumbra e do silêncio, havia sempre alguém que se interrompia só por lá passar. Shu! Shu! Silêncio! Qual tosse, qual espirro? Qual queda de livro?

Os bons leitores sabem conversar, escutam devagar, ouvem sons e sentem músicas. Vão e voltam logo que encontram amigos fiéis por entre páginas, frases ensinam novas estradas, descobertas comuns, risos e lágrimas em sinal de que se reconheceram para sempre.  O estranho sossego parecia ocultar milhões de murmúrios, diálogos sem idades, ou conversas milenárias com amigos de papel, tão envoltos em páginas como nós em vestuários. A moda não parecia marcar presença por ali.
     Depois descobria-se a beleza ou pobreza dos cantos da casa e via-se o gesto benemérito do mecenas ou a modéstia de alguém generoso que amou até à imortalidade as páginas que agora tantos podem consultar.
    Um livro é um milagre de vida latente, um encantamento de feiticeiros e bruxos, milhões de vidas mentirosas por se dizerem que são palavras quando nada é só palavra.  Há um mar de sereias sem voz, prisioneiras do tempo e do acaso de alguém que ali deixou muitas almas adormecidas que, depois de despertar, libertam ilhas, espaços, continentes, mundos sem fim. Uma ressurreição instantânea que, como todas as ressurreições, nunca traz de regresso o mesmo passado que foi, mas o luminoso futuro na História em sínteses de cada época.
    O passado desperta e quase que assusta a sua densidade que jamais se desvenda. Apenas nos afirma que, quem está aqui, a folhear negligentemente uma obra, deve a tudo isto a sua vida.
    Estes são os mortos que nos governam, que nos ensinam e escarnecem divertidos por não se aprender nunca tanta lição, explicações para todos os erros e ironias para tudo que se acertou pois, afinal, nada de novo há sob o Sol…
    Com a era do funcionalismo e do prático, o ambiente e a luz, o novo arrumo e desarrumo tudo parece respirar um ar de sala de aulas, a iluminação contínua sempre igual, quer dia, quer noite. O cenário leva-nos mais para futuros do que para passados. A simpatia do olhar não escapa a ser suavemente capturada, domesticada e quase hipnotizada para o que deve ser uma boa leitura. Seja lá o que isso queira significar para milhares de sentidos e interpretações.
    Se o progresso são tecnologias, o milagre do passado está perto e na biblioteca, seja onde for, isso trabalha e, quase por milagre, pode-se ter à mão as obras mais distantes do tempo e do espaço!    Numa biblioteca nunca se está presente, viaja-se. Escolhe-se, sem tempo nem espaço, partir à descoberta do segredo de novas palavras.

 

  •        Um regresso impossível

     

 Há uma doença epidémica chamada pressa que assola o mundo. Uma biblioteca não sabe nada disso. Morre a pressa quando se encontra ali um amigo, se descobre um inimigo, ou se luta por matar a curiosidade. Nunca se consegue matar por completo a curiosidade e isso é bom! Triste é descobrir, tarde de mais, quantos amigos se perderam por culpa da pressa. Com a obsessão de ter tanto caminho para escolher. Há sempre encruzilhadas. Cada escolha quantas outras elimina?
   As memórias alheias passam para mais alguém, todas as vezes que as páginas de um livro entram na arca das suas novas recordações. Só há leitores quando as páginas acordam de um sono que também acorda outros. É muito perigoso ler com sono um livro. A tragédia por começar aí. De nada serve ler se não houver um despertar astuto e atentíssimo. “Tenho medo do homem de um só livro”, escreveu São Tomás de Aquino. Temos de pensar com o autor mas não do mesmo modo nem sem outros, muitos outros e com toda a sonolência sombria bem ausente. 
  Em belas metáforas, com a obra “A misteriosa chama da rainha Loana” (2005) o semiólogo, filósofo e escritor Umberto Eco consegue transferir para um livro a memória de um italiano Yambo Bodoni que ficou amnésico. As leituras do personagem do romance são pretexto de visita ao passado para recuperar a memória perdida. Ao revisitar todos esses velhos livros, os mesmos  passam a ser o passado do leitor, que acompanha o personagem na peregrinação ao seu passado através das suas antigas leituras. São recordações guardadas nos livros que se leram na infância e adolescência, numa Europa insegura e intolerante, que tocava nos sonhos juvenis.
      Estas memórias, que só os leitores lhe emprestam, acordam a história da Itália vivida em tempos de opressão e medo dos “camisas negras” e do fascismo. É uma obra de reconstrução da História em que, outros europeus e estrangeiros não estarão tão familiarizados e só entram por mercê da ternura da reinvenção da infância e adolescência, paraísos comuns nunca esquecidos de dias felizes e banais.

 

 

  •    O fogo, a escrita a imprensa.

 

 

   Afirma-se que não há feitos nem História se não se transformarem em palavras escritas. Assim seria a História sempre uma distorção do passado quase sempre reinventado á custa das vitórias. A vida acontece e, depois, só a palavra permanece. Talvez só algures e para poucos mas é a única presença de toda a obra para além das pedras que não falam. Só fazem contar numa interpretação sujeita a mil artifícios. Por isso, se poderá concluir que toda a Humanidade, com seus sonhos e pesadelos, não passa de um imenso livro. Para Dante será “A Divina Comédia”, para a maior parte das gentes é só uma pedra polida e macia que rola sem fim nas marés da eternidade. 
     Diante de estantes sem fim, com os livros todos ordenados, quais soldadinhos à espera da campanha militar, pode sentir-se medo. Mil olhares tentam a sedução de alguém que passa. A memória humana é imensamente grande, mas só se guarda no que está escrito. Milhares de escritos que por certo mentem. Quem conta um conto… Depois há a vontade de dizer nem sempre acompanhada da dura verdade ou da realidade. Nunca alguém poderá atender a todas as formas de contar.
    Quem sabe quais os modos de pensar e viver de tantos seres humanos anónimos que, no fundo foram os que na verdade construíram este nosso mundo? Vivemos tanto a pensar para diante que nos esquecemos de olhar para trás… 
    Como era a vida das crianças e dos velhos na antiga Etiópia? Por que choravam ou riam? E os seus medos e alegrias?    
    Que se sabe dos gregos e dos etruscos? E das vidas na ilha de Páscoa? Quais os heróis de todas as guerras? E das mulheres que viviam tragédias sem fim? Se os feitos são descritos pelos vencedores, se a ciência conta os caminhos das certezas, onde estão os vencidos e todos os erros que levaram as certezas?
    A nossa era global, a mais complexa de todas, deixa uma enorme perplexidade e esperança quando ao futuro. Na Suméria onde apareceram os primórdios da civilização já surgiram bibliotecas de pedra se assim se pode dizer e os egípcios, persas e chineses logo os seguiram.
    Curiosamente, nessa milenária Mesopotâmia, “terra entre rios, o Tigre e o Eufrates, esse berço da nossa civilização onde se centram através dos séculos,  tantas polémicas, interesses e conflitos, a escrita era cuneiforme e foi muito difícil de decifrar. Isso só foi possível com técnicas mais recentes e comparações com outras escritas. Para não destoar do pessimismo e tristezas de todas as épocas, um homem da Suméria, para sempre desconhecido e anónimo, cerca de 3.200 anos a. C. deixou escrito:

"Lágrimas, lamento, angústia e depressão residem dentro de mim. Tolhe-me o sofrimento. O perverso destino me aprisiona e faz com que cesse a vida minha. Sou banhado por uma doença maligna."

 Parece que é um português do nosso tempo a falar mas esta queixa ou lamentação tão pessimista atravessou incólume milhares e milhares de anos.O que diz, não se pode entender no contexto em que vivia. A sua lamentação, no âmago do sofrimento, é o que se encontra sempre presente no mais profundo da vivência humana. Temos palavras retiradas do escrínio da História que as enquadra e que nunca se conhecerá. Apenas um eco deste apelo que vem através dos tempos nos torna irmãos.
    O pó ou a palavra eis o que resta para inventar o que não foi.

 

 

  •       O livro perdido

 

 

 

 

   Uma biblioteca pode parecer um local de espera como uma estação de comboio ou uma paragem de camioneta. Quem lá entra vai partir sem saber muito bem para onde nem onde vai chegar.

    De repente pode muito bem ver correr um coelho de cartola e de relógio de bolso, muito apressado e atrasado e uma menina que o segue intrigadíssima. Pode ver Samuel Pickwick, Esquire, a descer apressadamente da diligência, pode ver passar a bela e frágil Ofélia que vai desesperadamente para o rio, ou até Maomé com o anjo a receber revelações ou Abraão a ouvir as promessas de Deus. Com mais sorte encontra Job e discute com Deus as interrogações de todos os tempos e da condição humana.

    Todos os livros esperam um leitor que os ressuscite do seu sono forçado de milhões de palavras em repouso.

     Em que pensava Pessoa ao escrever seus versos? Quantos espíritos inquietos encontraram nele um irmão, um companheiro da vida, da angústia ou da solidão?  Quanto riso não fez brotar Mark Twain? Como conseguiu Charles Dickens transformar-se no espírito do Natal britânico? Quem se orgulhou de Os Lusíadas, ao ponto de levar Portugal no bolso para a emigração? São interrogações sem solução. Serão tantas as respostas quantas as pessoas que lêem pois o livro remete cada um para o  seu imaginário com o seu próprio mundo, acorda os seus sonhos mais esquecidos, inventa mundos ignorados, sentimento novos, interrogações nunca antes sentidas agora urgentes e necessárias.

       Alice e o coelho correm da infância, com as histórias dramáticas de Camilo ou os sonhos sociais da província de Júlio Dinis, o nosso livro de leitura da velhinha primeira classe, depois chegam em catadupa e aluvião os pesados dicionários, mais todos os vultos apagados das aventuras, das fadas, de mil descobertas de passados revisitados.

   Aquiles que luta, Tarzan esquecido,  Sísifo que quer ser feliz, a Heidi dos Alpes, o abrigo da prosa de Eça, a inclemência de Dostoievksi até à nossa mais recente descoberta que traz sinais  de algo que vem de muito longe connosco até à minúscula clareira do nosso tempo na imensa floresta  da eternidade.

   Com suas vagarosas páginas, as capas brilhantes, doridas de uso, cada livro mais se parece com o subir de uma montanha mágica, árdua de escalar, a espreitar novas amizades, encontros de velhos amigos, no retomar do fio labiríntico tão enigmático e subjectivo como é o mundo das nossas leituras, ora revividas, ora vagamente apagadas…

       Na pós Modernidade a tecnologia propõe um labirinto ainda maior. A ordem tem uma panóplia de códigos e de armadilhas de uma obscura floresta. É similar a um Cosmos com hermenêuticas quase ilimitadas. Há mil fragmentos do tempo a recolher e a organizar à semelhança de imenso espelho quebrado em que revemos a condição humana com humildade de nos reconhecermos pobres recoletores de migalhas. Um pouco como Ruth, a moabita, que vai atrás dos ceifeiros e apanha as espigas abandonadas. 

  Até haver este espaço que relembra vagamente o sossego e a serenidade de um claustro onde estudam e copiam pacientes monges medievais, já o Universo percorreu um caminho quase infinito.

   Se reflectirmos acerca do passado que nos trouxe até aqui, só podemos descobrir tantas causas e possibilidades que se podem traduzir num dos maiores espantos. Claro que são fragmentos e, por vezes, dédalos sem saída com Cronos implacável que nos devora em vez do cansado Minotauro que nos espreita. Uma biblioteca envolve-nos de ilusões quando a realidade é o sonho e este abre mil portas para o infinito.

    Descobrimos, então, saber muito pouco e a nossa ignorância aumenta vertiginosamente face à multidão de memórias e saberes. A ignorância não é já uma inimiga mas um saber que se torna nosso companheiro.

       Só recentemente milhares de dados existem no mesmo lugar para entender melhor o Universo com os seus biliões e biliões de anos. Comparado com tudo isso, a nossa existência humana dura muito menos do que um segundo!

  As grandezas as bibliotecas encerram grandezas ainda maiores do que qualquer geração. Porém cada época é mais um degrau para o saber. Subimos porque outros já estão atrás de nós na imaginária escadaria.

  Criamos novas noções de extensão, quase inimagináveis, a grandeza do Cosmos e de tudo o que os homens escreverem na esperança de serem entendidos e encontrarem amigos e alguns, raros mas valiosos, convencidos que terem encontrado caminho, soluções para mil problemas ou até a inefável Verdade.

     Um paralelo, se bem que modesto, surge para a biblioteca, com a suspensão da temporalidade e todos os encontros e diálogos são possíveis nas encruzilhadas em que vivos e mortos se encontram como amigos de longa data ou lutam com ironias ou até conseguem dar altas gargalhadas. Há quem queira contar “tudo” ou quem não quer contar “nada”, quem nos desafie, em negros duelos com armadilhas em cada página e cada palavra uma irónica cilada.

    É curioso como certas evidências que vêm da infância parece que se perderam ou nos passam despercebidas como esta: “O número de símbolos ortográficos é vinte e cinco”, afirma o escritor argentino Jorge Luís Borges na sua obra  “Biblioteca de Babel” (1941).

   Evidência óbvia na qual quase não refletimos. Diante da multiplicidade de combinações que esses 25 caracteres originam, não se pode descobrir perfeito e oculto “O Livro”, o sonho de um saber condensado e codificado para sempre.

   Surge a questão de Borges “Quando se proclamou que a Biblioteca abarcava todos os livros, a primeira impressão foi de extravagante felicidade.” (…) O universo estava justificado, o universo bruscamente usurpou as dimensões ilimitadas da esperança.”

  Para onde vai, porém a certeza do perfeito diálogo que se dissipa, mal os caracteres decifrados irónica e sagazmente nos interrogaram:

 

“Tu que me lês, tens a certeza de que compreendes a minha linguagem?”

 

 Um gelo repentino cristaliza todas as esperanças. Ao ler de novo, já será outro, e nunca se conhecerá esse amigo que de tão longe oferece as suas palavras para decifrar. Se calhar até se ria às gargalhadas do que se pensa e inventa acerca dele.

  Talvez baste meia dúzia de livros para encontrar certezas e depois descansar em paz. Quem ficar pela estalagem nunca saberá como venera a ignorância. Quem entra no labirinto da escrita e vai para além de meia dúzia de obras, começa a interrogar-se, a espantar-se, a ficar perplexo. Então começa a duvidar da veracidade da própria Vida quando só tem vida. A História existe coberta de poeira de séculos em memórias confusas, serenas, mentirosas e loucas. A vida fica reduzida a ser só a palavras que se desfazem porque as palavras se quebram como espelhos e perdem o sentido.

  Levamos a vida inteira a aprender a ler e suspeitamos cada vez mais que nunca seremos bons leitores. Um livro não é um livro, engana-se quem segura um, na sua mão. É uma porta que se abre para novos mundos. É uma arma, um veneno, um vento e até um feitiço que o tempo traz!

     A biblioteca, no seu orgulho secular, pode sonhar albergar aquele Livro que tudo sabe e tudo ensina. Mas a sua ironia está na lenta descoberta de que tal livro existe mas ninguém o pode ler. O livro onde tudo está escrito é esse de que fazemos parte e nos encerra na sua imensidade.

 

 

 

 

  •     O Dragão adormecido

 

 

 

         

       Os livros e a vida falam linguagens diferentes. Pouco importa a verdade pois só o escrito é um futuro contínuo. Hegelianamente o presente encerra todo o passado. Só o necessário se realiza e as possibilidades são muitas, porém uma só acontece. Os livros guardam relatos lacunares do que já não é. Interpretar é sempre uma traição, toda a gente sabe e cada realidade é filtrada pela versão dada.

     Todas as palavras de todos os livros contam o que se pensou, sonhou e acreditou. Há diálogos entre dois espíritos tão diferentes e divergentes, capazes de discutirem, aceitarem e admirarem um novo amigo.

    Um jovem muito convencido afirmava que nunca lia duas vezes o mesmo livro. Há muitos e a vida é breve. Pobre noção da leitura e do valor dos livros. O consumo entrou no sistema com leitores devoradores a quem o que interessa é chegar ao fim do livro como quem se empanturra com banquetes. Sopa, legumes, sobremesa. Será isto ler? Um livro assim nunca poderá ser um companheiro, um amigo, alguém que se conhece e tem sempre mais facetas a descobrir e a partilhar. Mesmo que não seja um amigo, também se aprende com as ideias opostas e podemos ser mais humanos com diálogos que se descobrem. Será a terrível epidemia da pressa que torna as pessoas assim?

     Essas obras lidas nunca serão de amigos pois na segunda leitura há cuidado em descobrir mais e há sempre outra forma de ler. Precisamos de rever amigos como de reler uma página. Mais vale ler pouco do que muito sem refletir.

    Ler a correr é o mesmo que travar conhecimento e dizer depois  Ah!, sim conheci em tempos. Ler devagar e reler é poder afirmar: Sim, é um livro a que recorro muita vez. Confundir conhecidos com amigos é não ter amigos. Desse modo, bastaria olhar para um quadro uma só vez e deixaria de ter interesse. Claro que as obras de consumo, como os policiais, são livros que exercitam o raciocínio e nos levam de dedução em dedução à descoberta do criminoso. Depois, esgota-se, qual charada descoberta.

Os livros ensinam a ler devagarinho e têm segredos escondidos que só oferecem aos leitores atentos e reconhecidos. As palavras relidas e reconhecidas têm cheiros, sons, calor e frio, sinestesias a evocar e interpretar.

    A História, tomada à letra, repete sempre o mesmo e corre o risco de se tornar numa grande e única narrativa como uma sinfonia em que tudo muda mas a melodia é a mesma. Há milhões de partituras para falar do mundo, do homem, da liberdade e do sentido das coisas. Deus, a grande questão, a Morte a nossa questão. E lá, dentro das páginas fechadas pode estar um dragão adormecido.

   Um livro fechado dorme. De repente, alguém acorda palavras terríveis, de condenação e morte. Um vento gelado é inventado e mente, ou diz verdades intoleráveis, ora doces ora cruéis. A palavra é  tão simples mas tem mais força que arma letal.

    O contágio do entusiasmo levado muito a sério por um punhado de palavras pode arrastar para a morte milhões de inocentes. É tão estranho que os mais belos e maravilhosos livros, os mais nobres e elevados espíritos tenham, com só com palavras, arrastado para o abismo milhões de inocentes na quimera do futuro feliz. Uma revolução é tão epidémica como uma utopia. Apenas a esperança muda de lugar e só brilha no céu, ou no âmago do sofrimento quando a utopia é letra de fé.

     Ninguém abra um livro inocentemente, sem saber que está a soltar um possível dragão. Já Carl Gustv Jung, psicanalista, escrevia que “quem quer matar o dragão tem de o acordar e depois tem de lutar com ele.”

   As palavras são armas, setas e espingardas, como podem ser venenos, ou medicamentos. Os bons leitores são raros e os outros estão contentes apenas por ler. Será que sabem mesmo ler? Talvez esse seja o seu calcanhar de Aquiles. A Bíblia, Mein Kampf, o Corão, o Capital foram lidas de tão variados modos como as multidões que os sentiram. Até um jornal pode ser dinamite que ataque alguém desprevenido.

    Ser leitor é tarefa de uma vida inteira. Passo a passo se aprende o trato delicado com as palavras que podem parecer pedra e depois nos remetem para longas viagens. Depois há a exasperante ânsia de reencontrar o primitivo sabor para entrar em novos jardins secretos que nem o autor sabe que criou.     A pedra, o amor, o rio, a morte, o sol, o ódio, as grandes e pequenas coisas repousam nas páginas fechadas. São armas de violência extrema, ou de ternura sem fim. Mentem, enganam face aos leitores incautos. Ao querer saber mais e mais, um leitor acaba por cair num poço sem fundo e cria o seu labirinto de onde nunca mais sai. Um filme de Bertolucci repetia a reflexão com a imagem da Praça da Paz em Pequim cheia de uma enorme multidão com o livro Vermelho na mão, e  um diálogo entre dois personagens:

           

              Não achas maravilhoso?! Milhares com um livro na mão!

            - Não, pois é o mesmo livro! - Responde o amigo.

 

    Realizou-se a terrível utopia! Quebrou-se a intimidade e desapareceu o dinamismo e espontaneidade, para ficar apenas milhões de cérebros entregues ao totalitarismo mais terrível, o das ideias.  “Timeo virum unius libri, tenho medo do homem de um só livro”, escreveu profeticamente São Tomás de Aquino.

Que se pensará de milhões de homens com um só livro?

 

 

   

  •  A Resposta Interior

 

 

 

      Pode dizer-se que, o que chamamos a história da humanidade é, na sua maior parte, anónima e desenvolveu-se por descobertas e revoluções obscuras, enigmáticas, sem rótulos de autor nem país, como a descoberta do fogo, da roda, da escrita, ou imprensa. Na era da globalidade, qualquer centro se dilui, se aproxima ou afasta, no anonimato de massas, de consumidores ou usuários. São inúteis quaisquer dísticos que nos remetem somente para desconhecidos artesãos. A massa miserável que trabalha para nós é anónima. Dela só sabemos que sofre.

      Descobrimos agora que não passamos de um minúsculo grão de areia no seio do Universos. Seculares guardiões zelosos arquivaram os conhecimentos ao longo dos tempos, a acautelar tesouros, bibliotecas carregadas do passado labiríntico. As suas verdades são lendas agora e as nossas verdades também passarão. Tudo se condensa num futuro em que se aglutina o passado.

    André Bonnard, ao falar dos gregos dizia que ao ver cair a chuva, qualquer grego interpretava assim:” Zeus chove” por isso Heráclito afirmava “estamos rodeados por deuses” e a clareza das sua língua foi uma das causas da filosofia ter nascido na Grécia.

    Era a glória e o orgulho de ser grego, de ter Jogos que reuniam todas as cidades estados e interrompiam todas as guerras. A luz de um céu claro ajudou a usar o raciocínio e a tentar, pela primeira vez saber qual a origem do universo, de modo puramente racional sem teologias ou mitologias. O berço da civilização ocidental é esse o pomo de discórdia de hoje e o rastilho para um futuro que ninguém sabe adivinhar.

    A persistência da memória é algo que Carl Sagan observa de modo exemplar ao referir-se à mente do ser humano:

 “No interior da cabeça de cada um de nós, há o equivalente a vinte milhões de livros. O cérebro é um lugar muito grande num espaço muito pequeno.” [Tradução nossa] . Cosmos, 1980, p. 278).

  Para a filosofia o mistério que nos rodeia causa sempre o espanto. Nunca nos devíamos cansar de nos maravilharmos de tudo o que existe. 

    A nossa memória, comparada a um livro, provoca vertigens pelo poder que dispomos e por ora ainda não sabemos usar completamente. Temos um arquivo com capacidades maiores do que todos os dados recolhidos durante uma vida inteira. Temos milhões de informações de uma complexidade enorme. Em vez de “estragar-se” a memória aumenta com constantes aprendizagens, numa atividade incessante como os músculos de um persistente atleta.

  A maravilha de tudo isto é que muito do que se aprende, ao longo da história, foi guardada nessas labirínticas estantes carregadas de livros, ou informatizados, cada vez mais organizados.

    Curiosamente, os hebreus afirmavam que a Babilónia era a cidade de Babel e da torre da confusão das linguagens que o célebre mito oculta. Isso é tão delicado de entender como impossível de contemplar as maravilhas dos seus jardins suspensos, hoje esquecidos num Iraque e Islão tão polémicos agora no paradoxo de um falso longe da nossa era.

    Pelas investigações dos historiadores podemos dar crédito a que a biblioteca mais antiga teria sido a do rei assírio Assurbanipal, de uma crueldade terrível, mesmo para essa época em que a vida tinha tão pouco valor diante das guerras e riscos de toda a espécie. Porém a criação do maior império do seu povo talvez não o tornasse tão famoso como por ser sensível à cultura. A ele se deve a primeira biblioteca na cidade de Ninive, no século VII a.C., cujo “livros” chamamos livros a placazinhas de argila, escritas em caracteres cuneiformes. Essa biblioteca teria cerca de 25 mil tabuinhas de argila com assuntos que iam da geografia a códigos de leis, medicina, augúrios, matemática, mitos e religião.

    É do conhecimento comum que a mais célebre e brilhante Biblioteca da Antiguidade foi a de Alexandria, no Egipto, fundada durante a dinastia ptolomaica. Carl Sagan citou, na sua obra “Cosmos”, um vulto feminino que ficou célebre nessa cidade na época do neo platonismo e inícios do cristianismo. Hipátia  (355-415, d C.) de Alexandria tinha uma cultura rara e o Renascimento fez reaparecer a sua figura esquecida sendo hoje recordada com admiração. Era filha de um filósofo e astrónomo que lhe deu liberdade de estudar, o que é raro para a época.

      Hipátia parece que nunca se afastou de Alexandria onde aprendeu na Academia. Admirada pelos discípulos, muitos deles vindos de longe ou senhores cristãos, pela sua dignidade e virtude manteve uma busca constante da verdade. Foi um seu discípulo, o bispo Sinesius que tinha grande simpatia por ela. Hipátia foi assassinada e o seu nome ficou ligado mais a esse facto do que a todo o seu saber. Bela, distinta e eloquente, o mito alia-se bem ao mistério. Muita obscuridade e lenda se ocultam à roda do seu nome e da sua vida. Diz-se que tinha um espantoso conhecimento em matemática, astronomia, filosofia, religião, poesia e artes bem como a oratória e a retórica. Nada resta do que teria escrito e tudo mergulha em especulações. 

   A polaca Maria Dzielska escreveu uma biografia, “O Espelho de Hipátia”, que pouco tem de comum com o filme “Agora” que também a evoca.

   Época de crises e de lutas, paixões e ódios acesos, Hipátia podia ser alvo fácil de atingir por ser diferente, suscitar invejas e desconfiança. Entre o paganismo e o cristianismo, a sua atitude tolerante mais acirraria os ânimos.

  A tolerância para uns parece fraqueza e para outros indiferença. É uma atitude perigosa no tumulto das emoções que apagam a razão. O apego à vida do espírito implica um certo estoicismo ou tranquilidade face à inquietação do mundo exterior. Um livro só se torna num bom amigo quando se consegue um diálogo e se regressa muitas vezes a páginas que se reconhecem e nos contam segredos.

   A resposta interior é indizível, os imaginários cruzam-se numa compreensão para além do autor e da obra em desdobramentos de espaço e de tempo. O leitor participa da saga dos escritores e dá-lhes vida. Haverá já pouco da época ou dos sentimentos e emoções do seu autor que nem por isso deixa de estar vivo. Sem temporalidade nem constrangimentos, a aprendizagem da leitura é uma aventura que muda as vidas na Vida. O herói anónimo, na sua proximidade e distanciamento dos grandes acontecimentos, altera a perspetiva do real e a banalidade de amanhã é o enorme sucesso do hoje.

 

 

  •     O fim de um início

                         

 

     Quando a vida humana começou, tudo parecia transparente e simples. Um pouco de comida, uma tenda, um punhado de certezas e um coração de fé. Medo de animais perigosos, de doenças, medo de ladrões, receios da noite, dos deuses e das suas punições. Nada que hoje se não sinta se bem que em contextos tão divergentes.  O patriarca Abraão, o pai da fé e dos monoteísmos, parte de Ur, perto da grande Babilónia numa viagem sem fim, em que podia sonhar uma descendência tão numerosa como as estrelas que contemplava. Tudo isto seria desconhecido sem a escrita e a conservação.

    Bem mais tarde, em 106 a. C., na China, surge o primeiro fabrico de papel a partir de elementos vegetais. Tal segredo era mantido cuidadosamente guardado e só era só permitido o uso pelas classes superiores.

    Os incêndios são a fatalidade de tanto do nosso passado. A desaparição da biblioteca de Alexandria deu azo a mitos de muito da antiguidade que se perdeu irremediavelmente. Fala-se em ter cerca de 700 mil documentos e nela foi incluída a biblioteca de Pérgamo, cidade grega, hoje em solo turco. É curioso saber que Cleópatra era uma das cientistas que trabalhava nos seus laboratórios e muitos foram os inventos e descobertas aí conseguidos. Os fogos que assolaram a cidade, como no caso das guerras com os romanos causaram a sua ruína e depois os fundamentalistas cristãos, que viam nessas obras perigos diabólicos e falsidades pagãs, quiseram destrui-la. Dos incêndios, o mais lendário é o do Califa Omar do qual se conta o famoso dilema:

 

 Se nesta biblioteca há assuntos que não estão no Alcorão deve ser queimada pois tudo o que interessa à salvação está no livro sagrado. Se contém assuntos que não estão no Alcorão, então é inútil. Logo nos dois casos deve ser queimada.

 

  A época medieval encontrou nos mosteiros, abadias e na classe clerical o seu apoio. Os doutores da Igreja como Santo Agostinho e São Jerónimo tinham livros, que já não eram de pedra, mas pergaminhos ou papiros. Esses conhecimentos escritos eram bens preciosos e bem guardados. Com um trabalho extremamente penoso, os copistas escreviam à mão obras completas e tinham de ser bem pacientes. Da Idade Média, temos a Biblioteca do Monte Athos na Grécia, os monges beneditinos espalhados por escolas com o seu centro na abadia do Monte Cassino, ou em Sevilha com Santo Isidoro e outros. A paciência dos copistas era posta à prova e o seu trabalho bem lento. A segurança dos mosteiros e abadias, que ninguém teria a atrevimento de saquear, apesar das guerras internas  e dos ataques exteriores,  permitiu  guardar e conservar a maior parte da preciosa herança cultural da Antiguidade Há pergaminhos que, com as maravilhosas técnicas de hoje, se consegue ler o que antes estava escrito e foi raspado. Alguns comentários são queixas dos copistas que se lamentam, até com sentido de humor, da sua espinhosa tarefa. Por outro lado, as iluminuras dos livros para além da beleza e arte, são preciosos testemunhos das cenas dessas épocas e dos seus costumes. Os “Livros da Horas” são bem prova disso.

    Um livro era algo muito raro e precioso. Alguns estavam fechados a cadeado e acorrentados para não serem roubados. Um só livro podia valer uma fortuna, e o seu preço podia igualar-se a uma quinta ou uma boa casa. O passado dormia sonolento por entre as páginas dos velhos incunábulos, palimpsestos, pergaminhos em sombrios arquivos e bibliotecas que raros tinham o privilégio de visitar.

   Na Europa, será preciso chegar a Johannes Gutenberg, criador do processo de impressão com tipos móveis adaptados a uma prensa que servia para espremer as uvas. É curiosa a vida deste inventor, se bem que grande parte da sua existência esteja envolta em mistério. Divergências políticas afastam-no de casa, foi joalheiro e um grande leitor para quem os negócios não eram favoráveis e acabou na insolvência, sabendo que morreu na miséria apenas com o apoio do bispo de Nassau. A sua adaptação da prensa, com os tipos que deixaram de ser de madeira e as tintas que aperfeiçoou, tornou possível grande quantidade de cópias dos livros que antes eram exemplares únicos e manuscritos. A sua famosa Bíblia impressa entre 1453-1455 e deve ser o livro mais caro do mundo. 

 Podemos afirmar que a revolução da Imprensa trouxe outras revoluções na Europa com a divulgação dos livros. O renascimento e a reforma protestante acontecem com a possibilidade da leitura e interpretação pessoal da Bíblia. É  também à imprensa que se deve a revolução científica e o aumento crescente da aprendizagem da leitura dos jovens pelo acesso às obras escritas. Com poucas modificações, assim se manteve até ao século XX. As mentes sedentas de saber começaram a ter acesso a obras que nunca antes nem ouviram sequer falar. A leitura secularizou-se quando antes era apenas para as elites e a classe religiosa. Fui um passo fabuloso para a razão e, pouco depois, as pessoas começaram a questionar as interpretações da Bíblia que antes aceitavam sem pestanejar. O uso da razão espalhava-se e surgiram as Luzes. A trama da história

    Tornaram-se então imensas as possibilidades da leitura a abrir as portas ao saber e à descoberta de novas terras   ou a viajar pelo mundo inteiro sem sair do lugar. O livro, os jornais e panfletos expandiam-se. É por causa dos panfletos que hoje mais se sabe da história do Drácula. Sabemos que os abusos que Vlad Drakul, o empalador, no século XV, cometeu contra o povo na Transilvânia foram denunciados em panfletos da época. Feroz inimigo dos turcos, era um sádico que todavia mandava construir mosteiros. É comum falarmos do Conde Drácula que existiu mas não tem nada a ver com os vampiros, rituais, mitos e toda a ficção de agora.

   A história dos jornais, panfletos e gazetas é também muito curiosa. Já existiam em Roma e ainda antes. Nas vésperas da Revolução francesa os panfletos eram sensacionalistas ou denunciadores de delitos ou corrupção. Já em 1556, em Veneza, já se publicava um jornalzinho e, como era pago com uma moeda, a gazeta, nome passou a ser atribuído ao jornal comum.

 Nos tempos da Revolução francesa o povo era mais esclarecido do que muitas vezes se julga e os leitores de jornais e panfletos não faltavam em Paris. A era das bibliotecas terá porém já desaparecido? Estamos ainda com um pé na pré-história e temos a esperar tudo, de bom ou de mal, de um futuro em que a Biblioteca terá um papel tão grave como decisivo. Com toda a tecnologia, qualquer biblioteca é um nó de um conhecimento que deixou de ter centro.

 Vivemos bombardeados de informações inúteis  e é dever estar atentos e críticos a tudo o que nos rodeia.

   Um livro pode ser um amigo, mas também um inimigo que nos vende a nuvem por Juno, nos alicia a não pensar.    Não se deve esquecer que pensar dói, é um esforço grave, obriga a uma atenção constante para saber ser livre.

  Aprende-se mais com os livros do que em conversas banais, mas também o livro pode ser uma alienação quando informa e não dá conhecimento, quando não se sabe usar o bom senso e o sentido crítico que custa tanto trabalho e desafio mental contínuo. É fácil seguir um livro que não obriga a meditar, só diverte e distrai. A multidão de livros que nunca leremos deixa-nos uma enorme insegurança, perplexidade e temos sempre que eleger alguns. 

   Ler não é tarefa de escola. Pode começar aí, mas na escola da vida há sempre um analfabetismo a combater.

   Se cada estudante ou investigador manuseia um computador, cada vez mais acessível e com potencialidades incríveis é um universo que se abre para as mentes.

  Foi há muito pouco tempo que espreitámos as estrelas para entender um pouco mais cientificamente o que nos rodeava. Os horizontes do Cosmos tornaram-se imensos depois do óculo de Galileu século  XVII e alargaram-se em todos os sentidos com o telescópio Hubble, no século XX.

 O número real dos astros é comparável à existência de todas as areias das praias do nosso planeta.

   Num outro cosmos, o da escrita, combinação dos símbolos das letras, abre também a porta a milhares e milhares de formas de conhecimento. Pelas descobertas que podemos fazer nos livros, eles são escritos pelo seu autor e na outra parte devem ser escritos pelos leitores atentos. 

    É o filósofo Pierre Levy,  na sua obra "Cibercultura" quem afirmou: o computador não é um centro, e sim um «nó» componente da rede universal que circula em todas as suas linhas.

  Também uma biblioteca é um centro, mas pode ser muito mais do que isso se conseguir transformar-se num “Nó” que nos faz cidadãos do mundo.  No futuro um diálogo de Platão com Erasmo, Musil, Confúcio, Hubert Reeves e tantos outros, sábios ou anónimos criará uma nova consciência humana

 Em certo sentido, há apenas um único computador, como há apenas a Humanidade e uma só biblioteca mas é impossível traçar seus limites, definir os seus contornos.

   Estamos habituados a falar sempre do final das coisas, da história ou do mundo, mas talvez seja mais certo falar do início que ainda não começou.