"Caminho de Atenas"
O estranho regresso dos Gregos
© Lúcia Costa Melo Simas .( 2010 )
Lugares do Império
[ Árvore abatida no Inverno. (pormenor). Jardim Botânico. Porto 2010 . ]
© Levi Malho - Imagem digital
“Quem nos libertará dos gregos?” eis o único verso e tudo o que resta da obra do poeta Clement só recordado por esta pergunta intemporal. Mas estamos tão gregos até não podermos mais, desde os “cavalos de Tróia”, presente envenenado do astuto heleno Ulisses, que agora são os vírus e suas manobras contra os desprotegidos computadores, mais todas as palavras que usamos, de cronos a rododendros, de utopia a caos e Logos a Antropologia tudo é gregos! Os mais eruditos saberão ainda o que é ficar para as “calendas gregas” mas ainda ninguém escapa de linguarejar grego mesmo sem saber que o sabe, nessa ignorância patologicamente grega!
“A filosofia fala grego” sentenciou o filósofo alemão, Martin Heidegger.
Toda a gente sabe que os gregos inventaram a filosofia para nosso desespero e falavam grego, claro. Recordamos uma colega professora que ficou mesmo furiosa e fora de si porque, ao tentar explicar o que era filosofia, sem qualquer êxito, uma pobre aluna replicou:
-Ah é isso? Fala grego? Agora já sei porque não entendo nada.
A professora podia ter rido da resposta
mas, sem sentido de humor, sentiu-se ultrajada por não conseguir que a
percebessem a ela e em bom português.
Agora, por sorte ou azar, depende do humor, temos um Sócrates
primeiro-ministro. Caso único na História Universal. Sócrates no poder é o mundo
às avessas! A incarnação da Lei da Polis num político assim é um paradoxo ainda
mais espantoso do que o medieval círculo quadrado. Algo muito grego se
anunciava, mas as profecias são sempre nebulosas como as Furnas dos Açores, as
profecias de Nosterdamus, as nuvens dos vulcões ou os mistérios de Paris vistos
por Vítor Hugo!
Quem já soube falar grego, para sua desgraça, o mais certo é que já esqueceu
a habilidade que tanto custo lhe deu para entender depois de começar a gaguejar:
alfa, beta, gama, delta…. Se assim não fosse, podia dizer aos turistas gregos
frases como esta:
--- Nautas que chegais em vossas naus voadoras _ e assim declamaria …..
Nautas que chegais em naus voadoras, os deuses do Olimpo vos enviaram a
este ebúrnea e
melânia esperam no areal com peixes, serpentes e corujas.
Nautas que chegais em naus voadoras, os deuses do Olimpo vos enviaram a este ebúrnea e melânia esperam no areal com peixes, serpentes e corujas.
Aletheia Dikeê (verdade e justiça)
Mataiothes (vaidade) Kaire Salve!
Então é que os pouquíssimos viajantes
gregos que por cá passam ficavam gregos de todo e fugiam a sete pés!
Felizmente, nunca vemos gregos pois, com um intróito destes, também nós não
íamos a lado nenhum.
Ir para nenhum lado é absurdo e ainda mais para a Grécia, em “Hybris
“( desmesura e fúria) desde que já não está nos livros, mas nas ruas em
manifestações.
A Acrópole é já apenas uma pequena ruína, a deusa da sabedoria
Atena pegou na sua
coruja e recolheu-se com Ares e Zeus. Nem a pitonisa desvenda já futuros, com
receio do que lhe possa acontecer depois de abrir a boca.
Vieram da Grécia os nossos inícios, o valor da lei, da democracia e da Polis
e claro que há menos tempos veio a epistemologia que pôs tudo bem grego nas
ciências todas!
. A incorruptível dignidade de Sócrates, o original, grego impoluto, fê-lo
beber cicuta para morrer pela Lei, assim deu um exemplo que nem sabemos o que
profetiza para o nosso que está vivo e pronto para as iscas. Não parece é que se
adapte a tanto grego.
Por cá, “vivemos à grande e à francesa” durante anos, deitados à
sombra da bananeira e falamos de crises e mais crises desde que Viriato
encontrou um romano perdido na serra e ficou perplexo!
Perplexos estamos todos nós com as crises, por serem permanentes, já nem se
lhes liga. Os gregos vão doidos para a rua em manifestações e confrontos,
enquanto nós também mas é por causa do Benfica! E depois cantamos por toda a
parte por causa de Fátima, que é árabe, e o país parou!
Temos brandos costumes, brandas leis doces e castigos ligeiros, como aqueles
papás modernos que castigam a custo os filhos e logo perdoam.
A saber bem as datas e iniciações, a crise começou quando Adão saiu do Eden e
há-de continuar, se Deus nos der vida e saúde, por esses séculos fora! As nossas
grandes glorias futebolísticas, os feitos dos navegadores, Camões, mais uns
tantos e aqueles do costume e eis que temos um pais belo, excelso, para “inglês
ver”. Eles ainda têm a libra, para nós nem escudos dos Lusitanos ficaram
para nos defender….
A crise bateu à porta dos gregos e eles reagiram gregamente. É o caos, as
greves e tudo em polvorosa. Por cá, nem se dá por isso, enquanto o Ronaldo
estiver bem, Portugal aguenta tudo. Nunca se afunda. Flutua. No Titanic não
devia ir nenhum português. Se lá fosse, aquilo era uma comédia e nunca tragédia.
Acreditamos, temos todos “o poder de acreditar” como o outro, “Yes,
we can ”e, num abrir e fechar de olhos, endireitávamos gregos e troianos!
Não perguntem em que é que os gregos iriam acreditar, mas iam mesmo. Saber em
quê é só um pormenor insignificante. Somos um povo pobrezinho com a mania que é
rico e a fingir que nem ouviu falar em Angela Merkel, a engolir meia derrota
eleitoral, nem dos olhos turvos que meia Europa incendiada de cólera nos lança
nada mesmo nos tira da cálida pacatez. No fundo, nada vai ficar dos gregos,
diria Fernando Pessoa, esperançado em vão “A minha Pátria é a língua portuguesa”
mas tem muito por onde andar sem ir à Grécia, nem querer saber o que por lá se
passa.
Nada nos muda ou nos faz mal. Bocejamos á
crise e até estamos á espera do pior a contar anedotas uns aos outros. Somos
pacientes, cordatos, temos as nossas férias, a nossa filosofia do “não é
comigo, não me rales, vou-te sofrer” e toca a ir para a praia, para os
Centros Comerciais e tudo criticamos e vamos gastando, mais um restaurante que
abre, mais uma Marca que lança produtos!
Luís XV dizia pachorrentamente num bocejo: “Après moi, le déluge”. E
foi!
Mas tal não acontecerá connosco. Temos a sabedoria socrática do Ministro mais
bem vestido, à George Clooney, sem o nariz, é óbvio, divertido, razão de mil
anedotas da Internet ou noutros locais recomendáveis. Este Sócrates não foi á
guerra como o outro, mas è imbatível como um couraçado russo.
Temos o grande Cavaco que calmamente “não responde” com um sorriso
amarelo que anuncia uma úlcera de estômago bem tratada a bolo-rei, até tudo
ficar em cavacos, o que não é desgraça nenhuma pois sermos um país alegre. Mesmo
muito Alegre e algo Nobre. Com o povo todo governado alegremente e um
primeiro-ministro assim “fashion”, vamos pôr os chinesinhos, todos de
olhos em bico porque este país foi, é e será sempre um país feliz e contente por
todas as crises, milhões sejam elas. Os outros povos, coitados, esfalfam-se a
trabalhar e nós íamos perpetrar tais loucuras?
Dêem-nos uma boa telenovela, propaganda embrulhada em anúncios, telemóveis a
funcionar, um sofá numa sala de espera, mais todas as engenhocas de ponta!
Quando a crise é grave, o melhor é rir.
Podemos morrer todos de fome mas, ao menos com um dia de Sol, um relógio
Pierre Cardin, mais uma mala Louis Vuitton, carregadinha de roupa de marca para
usar no enterro.
O Sócrates II, não se suicida, nem morre. Sai incólume de tudo, é “a força
de acreditar”! Depois de cavaquinhos a tocar, teremos alegria para dançar,
pois há sempre uma porta que se abre.
Quem fala mal de nós, é como a raposa:
--- Estão verdes, não prestam.
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