"   Memórias de Alice - XII " 

  •  Marx e Jenny. Lições de Economia no "feminino"

 

    ©  Lúcia Costa Melo Simas ( 2013 )

 

 

 

 

" Os Trabalhos e os Dias "

 (Parafraseando Hesíodo, pormenor do painel de azulejos "Ribeira Negra" de Júlio Resende, assinalando o trabalho Feminino. Zona da Ribeira, Porto, 2007 )

 © Levi Malho.

 


 

Afinal como circula o dinheiro, senão transformado em moradias, automóveis, viagens, diamantes, ouro e mil adornos, perfumes, vestuário elegante e variado, capital para bons empreendimentos e mais bens para comprar de novo? Por que razão não se procura a explicação na interioridade do ser humano e e observe de perto a vida dos homens? A economia é fascinante no seu lado interno e subjetivo que é aquele, com que todos até certo ponto admitem, o que mais preocupa na vida.
    A biografia de Marx (1818-1883) causa certa perplexidade por ter as contradições
da sua época que se multiplicavam com as suas excentricidades e personalidade com múltiplas facetas. A sua mocidade trouxe grandes deceções tanto para o pai como para os seus amigos, espacialmente o pai de Jenny, Ludwig Von Westphalen que era um liberal, mas  "chocou-se" com a vida tumultuosa do jovem Marx.

 

Figura 1 - Enquanto " baronezinha", tirava um retrato para a posteridade onde irradia sob a suavidade, uma  força de vontade  pouco comum

 

 

A paixão que começou na infância por Johanne Bertha Juile Jenny von Westphalen, uma jovem da classe dominante prussiana, aristocrata, filha do prestigiado barão Westphalen, é quase sempre esquecida. Marx era de classe burguesa e judia abastada e convertida ao luteranismo. Se as teses marxistas não são românticas, é nessa atmosfera que as famílias viviam.

 

 

 

Figura 2 -  Johanne Bertha Juile Jenny von Westphalen.

 Na sua juventude era uma beldade na sua cidade, que adquiriu fama de ser das mais interessantes e inteligentes jovens do seu tempo

Na sua genealogia estavam os mais brilhantes nomes ilustres.

 

 

 Jenny tinha um espírito invulgar para a sua época e uma educação brilhante, além de frequentar a Corte, adquirira fama de ser das mais belas jovens da sua época, escrevia poemas e  a sua vasta cultura ultrapassava o comum da sua classe. A paixão transformou-se em compromisso secreto e após um longo noivado, iniciado secretamente em 1833, a rebelde Jenny casa com a oposição das famílias. Pouca gente assistiu à cerimónia e a jovem Jenny quis casar-se com um vestido verde da cor dos seus olhos.

 

 

Figura  3 -  Jenny foi uma mulher lutadora capaz de mostrar a maior coragem face ás adversidades

 

 

 

Ela, sem dote, com 29 anos e ele desempregado e com 25 anos, viverão juntos 38 anos tumultuosos e incertos, mas sempre com afeto até à sua morte aos 67 anos no exílio de Londres.  Deixou Marx desolado e só cerca de um ano lhe sobreviveu. O tempo em que ainda resistiu foi de constantes queixas e lamentos de dores, de doenças, de mil e um problemas de saúde.
     Para Jenny foi uma felicidade amarga não saber que, as suas duas filhas, sobreviventes às doenças da infância, acabaram ambas por se suicidar.
Apesar dos erros ou excesso da obra de Françoise Giroud, (1993) que é de grande irreverência para com o filósofo do materialismo dialético, “Jenny Marx ,ou A mulher do Diabo”[1] realizou-se um filme para televisão francesa, com base nessa obra.

 

 

Figura 4 -  Uma obra irreverente, com sentido de humor, se bem que com falhas e tendenciosa, é uma defesa da Mulher e especialmente de Jenny

 

 

Jenny durante toda a sua vida, nas circunstâncias mais penosas, conservou sempre um bem precioso a sua dignidade “um poder mágico”, como dizia o poeta Heine, mal a conheceu em Paris e que com essa força muito contribuiu para bem de Marx e da sua causa, apesar de este lhe trazer tantos problemas. Sofreram uma série de exílios, primeiro na França donde foram expulsos em 1848, indo para Bruxelas, depois para Colónia e acabando na Inglaterra. Além da perfeita ausência de sentido prático de Marx, as dívidas, os excessos de álcool e muitas deceções aliavam-se a dias de penosa miséria. Por outro lado, Jenny teve tempos fugazes em que recebeu algumas heranças, logo dissipadas pelo marido, mas que lhe permitam momentos de desafogo e recebiam os seus convidados em grandes festas.
    Nas cartas de Jenny pode ver-se quanto sofreram os Marx. Dos seus 7 filhos, apenas 3 sobreviveram à infância, as habitações inglesas a que ela chama “buracos”, as dívidas constantes e as desordens de Marx e as suas crises e desconcertos.
Jenny fora uma jovem de grande beleza, muito inteligente e audaz, que frequentava a Corte num meio requintado e elegante. A vida de Marx muito lhe deve. Depois que encontrou o seu amigo Engels, o seu entusiasmo, espantosa lealdade para com ele, trouxe novo rumo

 

Figura   5 -  Marx e  Jenny, a bela Baronesa vermelha.

Repare-se que tal qual era tradição a mulher está de pé e o marido sentado. A beleza do rosto de Jenny, já mostra uma severidade e firmeza de quem tem enfrentado mil dissabores.. Marx envelheceu bem depressa o que pouco admira com a vida que levava ( Foto após poucos anos de casados. )

 

 

Tristran Hunt[2], descreve as contradições espantosas, de Engels, na biografia “Comunista de Casaca. A Vida Revolucionária de Friedrich Engels, ” 2010,   Friedrich Engels (1820-1895):

 

 

Figura  6 - O jovem escritor Tristam Hunt revela com rigor e irreverência a vida de um polémico e injustamente esquecido intelectual que Karl Marx deve quase tudo o que hoje é ainda.

 

A sua personalidade invulgar ligou-o a um amigo que pela sua deslealdade e ingratidão muito o desgostou. A generosidade de Engels é que não tinha medida. Além de ser um magnata de têxteis, por herança paterna, era membro de uma Bolsa de Valores e presidente do Instituto Schiller. Bebia muito e tinha hábitos boémios contrastantes, com forte gosto pelo luxo. Apesar disso, a sua vida mudou radicalmente aos 22 anos quando foi para Manchester, por ordens do pai, e aí pode ver a terrível miséria em que viviam os trabalhadores ingleses.

 

 

Figura   7 - Mais do que palavras,  a gravura do famoso Gustave Doré, é bem elucidativa da miséria da era vitoriana

 

 

 Isso despertou-lhe uma tal piedade que escreveu em sua defesa. Paradoxalmente detestava trabalhar e teve uma vida pouco exemplar. Porém, esse mesmo Engels financiou Karl Marx durante 40 anos, arcou com os cuidados de toda a sua família, das filhas e dos genros. Era ainda ele quem ajudava a acalma-los nas suas fúrias, escreveu com ele enquanto também Jenny redirigia os manuscritos e tratava dos aspetos práticos da fundamentais para a família e da causa. O desinteresse de Marx pelos seus pais é chocante e interesseiro. Quando o seu pai, o advogado Heinrich Marx, não apareceu e ainda disse que era por , “não tinha tempo a perder”.
    A sua mãe, Henriette depois de lhe pagar muitas das despesas, acabou por não mais o ajudar. Parece que ainda teria dito por ironia: "Devias arrecadar algum capital em vez de te limitares a escrever sobre isso.” Também ofendeu fortemente a escritora George Sand que foi em 1848 partidária dos socialistas revoltosos, mentindo acerca de umas cartas que a escritora nunca redigiu mas que serviam para minar o prestígio de Bakunin, o comunista russo, acusando-o de ser um agente secreto da polícia czarista. Marx não tinha escrúpulos morais e respondeu a George Sand que servia isso para “para defender o movimento socialista dos governos capitalistas
[3]

 

Figura  8 - Uma idílica visão de uma família que nem era feliz nem era sagrada senão pela presença e a força de Jenny.  Sereno, Engels contempla o quadro!

 

 

    O “Manifesto Comunista” e a continuidade de escritos, devem-se aos desvelos destas três personalidades, Engels que deu muitas das ideias de um anterior trabalho seu, o apoio material e a redação conjunta deve-se aos três. Quando se elege Marx como grande filósofo, sociólogo e economista, o nome de Engels vai para a sombra e o de Jenny nem aparece.

 

 

Figura  9 - Uma obra de um jovem Tristam Hunt, que desmascara muito da tradição e da história oficial do Marx e Engels

 

Só injustamente Engels é inferior a Marx. Foi sempre firme e teimoso, mas são também as suas ideias que ressoaram no mundo, no dizer de David McLellan, professor de teoria política da Universidade de Kent, e outros estudiosos.  Deve-se à lealdade e apoio de Engels, que Marx  ocultou um filho pois referia que Jenny era “terrivelmente ciumenta” e, por isso, receava uma separação.  David McLellan, sustenta que o filósofo “não amava a criança”.
    Toda a vida deste revolucionário manifestou forte egoísmo e uma falta de moral que para ele devia mudar de acordo com a ideologia, logo mentir ou enganar não era mais um meio de mudar as mentalidades, se isso fosse necessário para ele ou para a causa não hesitava nunca.

 

Figura  10 - O filho que Marx, ( Freddyn ), não assumiu e que Engels teve a generosidade de dar o seu próprio nome.

 

Jenny sofreu mais esse desgosto e escreveu confidencialmente: “No começo do verão de 1851, houve um acontecimento que não desejo relatar aqui, embora contribuísse muito para aumentar as nossas preocupações, tanto pessoais como outras”. A empregada, uma camponesa, criada da casa de Jenny, tinha 28 anos e Marx 32.

 

Figura 11- Helen Delmuth atraiçoou Jenny que lhe tinha grande amizade.

As duas mulheres lidaram com uma estranha cumplicidade neste caso. Mas Jenny sofreu muito com este caso.

 

Jenny nunca sucumbiu à miséria, às tristezas, à vida de exílio, à luta constante e escreveu: Nestes tempos difíceis, deve-se manter a cabeça erguida. O mundo pertence aos corajosos”. A coragem e a inteligência desta baronesa, que abandonou o luxo e a vida confortável para enfrentar tantas dificuldades, exerceram um poder sobre os partidários de Marx, que não se menciona, mas lhe atraia grande prestígio.

 

Figura 12 -  Retrato de Jenny cerca dos quarenta anos. A sua tristeza é patente no olhar

 

Oficiosamente, Engels assumiu a paternidade do filho de Marx. Este explorou o seu protetor, sem escrúpulos, e permitiu que o seu filho tomasse o nome Engels, a custo da reputação deste.
    Para o bem do casamento de Marx e da causa política, Engels aceitou a situação se bem que depois se sentisse magoado com a ingratidão do amigo. É bom recordar que para a causa do seu partido, os grupos de inimigos de Marx muito gostariam de o difamar de todas as formas e a defesa de Engels e a altivez de Jenny foram fulcrais.

 

Figura  13 -  Marx e Engels a prova da "mais valia"

 

A sua arte em economia era ardilosa e quase divertida. Nunca aparentou estar na pobreza sabendo esconder qualquer sinal de dificuldades financeiras. Conseguia manter a aparência de um luxo falso nas salas, cujas paredes tapava com cortinados. Depois, até com o apoio das filhas, sabia vestir-se sempre elegantemente. Jenny sobreviveu por aprender a aparentar riqueza. Um ardil inocente que dava mais crédito aos Marx.
    Recuperava as roupas usadas, tingia e recortava tecidos, consegue dar um aspeto novo às suas vestes e, em ocasiões solenes, usa joias falsas com o melhor manto que ainda tinha.

 

 

Figura  14 - Nas ruas fétidas de Londres, corria em busca de casas de penhores, onde era conhecida apesar de ser a Baronesa, era ela quem tratava desses assuntos

 

 

Nada da vida oficial de Marx desacredita a sua fama e a generosidade de Jenny com todo o seu apoio sejam esquecidos. Há provavelmente um espírito do tempo que movimenta os povos e as ideias marxistas foram o fósforo que incendiava as florestas. Karl Marx aplaude o trabalhador, mas não gostava de trabalhar, explorava o amigo, o rico industrial e a mulher que tratava do serviço da casa, lutava por lhe encontrar amigos, resolvia mil problemas e conseguia pagar os seus gastos. Jenny tem, entre muitas, esta confissão:
     
Em todas essas lutas nós, mulheres, temos que arcar com a parte mais árdua (...) porque é a parte menor. O homem retira forças da luta com o mundo externo e é fortalecido pela visão dos inimigos, ainda que eles sejam uma legião. Nós permanecemos sentadas em casa, remendando meias”

 Marx, o sociólogo e filósofo das massas ainda disse, e deve sido em tom profético e convencido, que “O capitalismo gera o seu próprio coveiro”. Se errava acerca das consequências económicas e do desastre social do comunismo, que matou e reduz ainda milhões a outra alienação e miséria, acertava acerca das dificuldades do capitalismo.

 

Figura  15 - Muito envelhecida Jenny, nos seus últimos anos,  ainda guarda a altivez que lhe deu sempre o respeito e a admiração dos que a conheceram.

 

 

O problema está no modo de olhar. Se olharmos para cima seremos sempre pobres, mas ao olhar para baixo essa pobreza transforma-se em muitos bens. Nem sequer todos úteis. O escravo, ou trabalhador, gosta de ser escravo. Nietzsche já o notara. O grande rebanho não é propriamente pobre. Mais pobre se sentia ele e assim via os que queriam ser superiores. Esses, não trabalhavam para si, mas para a cultura e com isso nada  recebiam em troca. O grande risco da cultura era que se tornasse útil. “Se acreditarmos que a cultura é algo útil podemos confundir o que é útil com a cultura”.
     Ora o que vemos é que isso acontece nos nossos dias. Só que Nietzsche lutava por algo ainda superior no seu tempo à economia. Lutava pela cultura no seu sentido superior e desinteressado. 

 

Figura  16 - A família Marx, com as suas duas filhas, na companhia do seu grande protetor e generoso colaborador Engels.

 

 

O futuro não foi nada semelhante às verdes utopias. É certo que a palavra capitalismo ainda gera arrepios na espinha de políticos, empresários e similares, mas varreu o mundo, pior do que os furacões. As utopias que os pseudoestados democráticos instalaram trouxeram sempre a miséria para as multidões e o enriquecimento fraudulento de alguns que sabem sempre manipular as massas. A imoralidade marxista que se alastrou já existia no espírito de Marx que se apropriou indevidamente do pensamento de outros, alterou discursos e estadísticas, datas e documentos que consultava. Refira-se apenas aqueles que usou indevidamente na manipulação de dados estatísticos contidos nos Livros Azuis de Biblioteca do Museu Britânico, de tal modo que os analistas da Universidade de Cambridge (apud Paul Johnson, em Intellectuals, W&N, 1988) consideram os dados existentes em “O Capital” de uma “assombrosa temeridade”.

 

 

 

Figura 17 - O local preferido de Karl Marx para passar o tempo em Londres era a Biblioteca do Museu Britânico

 

 

Os comunismos que conseguiram transformar o Estado em capitalista ficaram todos pobres. Mas sofrer e trabalhar por um futuro utópico para ir para a “Terra do Nunca” onde todos têm tudo o que precisam é um sonho maravilhoso. A utopia desfaz-se quando a riqueza se distribui sem ritmo certo, nem regras sólidas, por quem menos se espera que enriqueça.
    Vem tudo isto ao caso da descoberta involuntária, nem por isso menos irónica, nem verdadeira. Não é o liberalismo, nem o comunismo, nem o maoismo, nem todos os revolucionarismos reformados e reformistas que atrapalham o capital e o distribuem de todas as formas e feitios por exploradores e proletários. Isso é ver mal a sociedade e não compreender a condição humana na sua subjetividade mais autêntica. É na subjetividade e no anonimato que a maior parte da economia se explica. As teses são somente fórmulas que se estudam e gastam.

 

Figura  18 - Marx e as especulações na Bolsa. Afinal foi um mito que se viveu uma realidade que revolucionou o mundo?

Entre os EUA e o México Marx defende o capitalismo. Que lição se infere?

 

Jenny deixou uma lição intelectual de economia, dignidade, coragem e trabalho no feminino.  Mais tarde Wilhelm Liebknecht o famoso socialista alemão, escreveu “Mãe, amiga, confidente, conselheira, ela foi para mim o ideal de uma mulher e ela é meu ideal. " .Talvez uma metáfora ajude a acordar do sono dogmático o marxismo, renovado ou não, que ainda soletra “O Capital ” e não permite bocejos.

 

 

 

 

 

 

Figura 19 - O escritor inglês da era da industrialização e do Império Britânico,  E. Philips Oppenheim   (1866-1946)

 

Um escritor tem armas capazes de derrubar impérios, de os construir ou apenas de nos fazer sorrir?. O riso de Oppenheim esconde uma lucidez atemporal contra teses temporais.
     Dedicou-se à escrita policial, mas numa obra, aparentemente ingénua, pintou a tese dialética do em si para si e fora de si, da mais-valia e da economia que é um tratado sobre o capital da forma mais humorística e camuflada que possa aparecer. É uma obra que tem uma profunda análise económica e social da época que escapa a uma leitura menos atenta.

 

 

Figura   20 - E. Philippe Oppenheim, no fim da sua vida, no seu belo gabinete, eis o "príncipe contador de histórias", um famoso escritor com uma não menos complexa vida, conhecedor dos meandros da política e das intrigas internacionais.

 

 

Usa de uma acentuada ironia sem perder o sentido de humor inglês, e escreveu o que parece ser uma metáfora, em que se descobre as teias plenas de subtilidades de todas as lições de economia.

 

O nome ilude  --- “Milionários à força”  (Editorial Minerva, S/d. )

 

Figura  21 -  A solução para todos os problemas da economia e da circularidade do dinheiro

  

Podia ser um tratado de economia no sistema capitalista inglês e mostraria como este se autocorrige e revitaliza. Mas é aparentemente um livrinho delicadamente humorístico. Segundo as palavras de Pina e Cunha no "Jornal de Negócios" de 1171172013 :

 

 

 

Figura   22 -  Miguel Pina e Cunha, escritor e analista de Economia

 

O capitalismo é uma palavra forte. Gera emoções: amores e ódios. Tem uma carga ideológica, mas representa, acima de tudo, uma ideologia pragmática: quando a sociedade se organiza em torno da ideia de mercado livre suportado por instituições fortes e respeitadoras do Estado de direito, o capitalismo permite que cada um ofereça soluções para a resolução de necessidades ---- essa é a essência do empreendedorismo.

          Aqui, gostei do termo "empreendorismo".  A obra narra a vida de dois honestos irmãos, empresários londrinos, que herdaram do pai uma firma bem sólida. Consciente do caráter impoluto dos dois filhos e temendo que continuassem a prosperar, avisou-os do seu desejo que eles, sem se tornarem perdulários gastassem bastante para não morrerem com fama de avarentos.  Poder-se-ia falar no “pecado” dos dois irmãos em criar riqueza, também se esconde a desconfiança ideológica em relação ao lucro mas tal não se diz.
    Perplexos, mas convencidos de que lhes seria até mais fácil gastar a boa fortuna da sua firma do que continuar a gerar lucros, passaram a tentar lealmente melhorar a sua forma de vida, a negociar sempre com honestidade e a gastar em tudo o que podia parecer viável. Emprestaram dinheiro, compraram um hotel e um teatro arruinados, um clube de golfe num sítio impensável, tudo com risco calculado ou quase na falência, mas com a sua capacidade de gestão, competição leal, o seu espírito empreendedor e honesto, acabavam sempre com mais lucros. O testamenteiro, cada vez mais descontente, voltava a avisá-los que não estavam a cumprir os desejos do seu defunto pai e eles andavam cada vez mais consternados.
    Tudo tentava e acabavam por falhar. Isto é, conseguiam aumentar cada vez mais a sua fortuna com negócios que em vez de ruinosos se transformavam em êxitos, já que não podiam, pelas recomendações paternas nem especular ou esbanjar os lucros da sua empresa. Estavam quase a desesperar quando finalmente surgiu uma solução. O mais novo dos irmãos encantou-se por uma bela e honesta senhora e decidiu casar-se.

 

 

 

Figura  23 - Quanto capital não se acumula e circula por causa desta linda senhora?

 

É então que o testamenteiro rejubila, o pai descansa em paz na cova e no céu, ou até nos dois lugares e os irmãos juntam-se para satisfazerem todos os caprichos da esposa e cunhada que alegremente, sem ter aprendido economia, nem tido lições de negócios acerca de Marx e do famosíssimo termo atribuído â diferença entre o valor da mercadoria produzida, depois do valor dos meios de produção somado ao valor do trabalho, tem a firme certeza de que sabe para que serve o dinheiro, todo o lucro e mais-valias incluídas.
    No final do livro, entra então a bela senhora no hotel onde vivem, a meio de uma manhã em Londres, seguida do porteiro e de uma alegre multidão de criados carregando compras e mais compras, em coloridas caixas, sacos e caixotes. O marido espanta-se:

--- Mas, por que razão, estás aqui? Pois não dissestes que não almoçavas connosco?

 Não vinha, era certo. Mas… acabou-se-me o dinheiro! Com ligeiro espanto, o marido fitou o irmão e os seus olhares de admirados, passaram a êxtase de alegria. Os dois honestos milionários, ainda incrédulos, perguntaram:

--- Mas tinhas 500 libras esta manhã!?

--- Acabaram-se. É preciso ir ao Banco antes que feche, pois encontrei uma verdadeira preciosidade na Oxford Street. Não posso perder a oportunidade!

Deslumbrados, os dois irmãos, sentiam-se agora, livres e felizes. Tinham encontrado a solução para a sua economia. Da economia em circularidade veloz, com uma mais-valia, que se protege e protege a globalização na localização, poucos terão consciência.
    Lá no fundo, a mulher não precisa nem de tocar no dinheiro. Todo o sexo feminino, de qualquer classes, sejam elas quantas forem e mais diversas, não há mulher não  saiba, logo que tenha um pouco de bom senso, gastar em compras sem fim e distribuir prendas, sem chegar a disparatar. A moda, ao seu lado, sempre solicita e sorridente,   orienta qualquer mulher depressa e sem parar.

 

Figura   24 - Um título provocante, irónico romance policial ou mera coincidência?

 

O segredo que Marx nunca descobriu e esteve toda a vida ao seu lado ---  a Mulher !
     Na verdade, a solução para “O Capital”, Marx teve-a ao seu lado, quase toda a sua vida, e não a via. Obcecado pelas teses e teorias de materialismo histórico e dialético, a realidade que queria mudar passava-lhe mesmo ao lado, Jenny, a boa esposa que lhe remendava as meias e fora filha de Barão, de famílias com bom fortuna, ali estava ela, envelhecida por escrever tanto manuscrito, calcorrear tanta rua, esconder-se na clandestinidade, economias de “que há para comer amanhã?” A quem vou tentar pedir mais empréstimos?
      Que papel mais errado lhe deu o marido. Desastrado e idealista, a sonhar com grandes futuros, utopias, liberdade e bom trabalho, enchia-se de dívidas e esquecia que a economia sempre começou em casa. A mais-valia manifesta-se bem quando chegam mais visitas para o jantar. Na cozinha, o empreendorismo é rei. Depois com um sorriso, a dona de casa volta para a sala, como se nada se passasse-  Quem é capaz disto e de todo o resto?  A Mulher.

 

 


         NOTAS:


 

[1] Giroud, Françoise. Jenny Marx ou a mulher do diabo.1996,Record,  Rio de Janeiro,

[2] Hunt, Tristam – Comunista de casaca. A vida revolucionário de Friedrich Engels, 2010, Editora Record, Rio de Janeiro.

[3] Ipojuca, Pontes - Sobre a moralidade de Karl Marx ,Jornal da Tarde, São Paulo, 2001. ( http://www.olavodecarvalho.org/convidados/ipojuca2.htm 29.11,. 2013 )